10 agosto 2013

Capítulo 24


ESCRITO POR: MAYRA BORGES


Chegamos à padaria e de repente descobri, redescobri, como fosse, que havia paz ali, aconchego, uma espécie de refúgio, não era só o cheiro de pão fresquinho ou os doces aromas que pairavam no ar. Ali não era o meu lugar favorito por ser lindo ou fazer o melhor café, era palco de lembranças memoráveis que eu não poderia esquecer nunca, mesmo as mais tristes.
Havia uma lanchonete a parte para os clientes que gostavam de tomar café ali mesmo, muitas vezes havia ficado horas ali com uma xícara de café e um livro qualquer, sempre que não queria a solidão como cúmplice eu descia a rua e entrava lá.
                - Bom dia, o que vão querer?
                - Dois cafés fortes, por favor._ pedi.
                - Fiquem à vontade que já sirvo._ disse o atendente.
Dirigi-me a mesinha do canto, mais confortável e reservada, o Carlos me seguia com passos duros e semblante pesado.
                - Por que você me trouxe aqui?
Abaixei a cabeça e suspirei.
                - Foi aqui que a gente começou, é um lugar importante, não acha?
                - O que quer dizer com isso?
                - Que me sinto à vontade aqui, algum problema?
                - Não.
Ele olhava para além da janela, como se procurasse por respostas inexistentes.
                - O que você quer me dizer?_ ele perguntou.
O rapaz veio entregar nossos pedidos e se afastou rapidamente.
                - Lembra que me perguntou por que eu não consigo mais acreditar no amor que você sente por mim?
                - Uhum._ ele bebericou o café e por fim olhou pra mim.
                - É tão difícil te dizer isso.
                - É igualmente difícil ficar aqui esperando você tomar coragem pra me dizer que não quer mais ficar comigo, inventando motivos pra essa decisão, dando voltas pra dizer que não consegue mais sentir o meu amor porque foi você quem deixou de me amar e já faz muito tempo._ ele jogou todas aquelas palavras aos montes na minha frente, me deixando atordoada, confusa.
                - Não é bem isso...
                - Então o que é?
                - Eu não estou procurando desculpas, eu estou falando a verdade. O amor não é só de palavras, não se alimenta de si próprio, ele requer cuidado, atenção, tempo, requer gestos.
                - E eu nunca te dei nada disso?_ finalmente vi que os olhos dele estavam marejados de lágrimas pesadas.
                - Nunca é tempo demais, mas já faz algum tempo que estamos distantes e não me refiro apenas ao físico.
                - E o que você quer que eu faça?
                - Nada.
                - Você também não coopera, como é que eu posso fazer alguma coisa se eu não sei o que está errado?
                - Não percebeu o quanto tenho estado distante de você? Antes você me buscava, me trazia pra perto, enfrentava tanta coisa por mim e hoje? Você nem se importa mais em me ligar.
                - Não queira que as coisas sejam eternamente as mesmas.
                - Não quero, mas a meu ver num relacionamento as pessoas criam laços e não nós. Criam vínculos, não me sinto mais pertencente a um sentimento em comum, mas em uma coisa você está certo.
                - O quê?
                - Talvez eu tenha deixado de te amar a muito tempo, e pra mim não dá mais.
                - Há quanto tempo?
Dei de ombros.
                - De que importa?
Ele levantou o braço pedindo a conta.
                - Você tem razão, nada mais importa aqui._ ele secou as lágrimas e eu também sequei as minhas.
                - Não queria que as coisas chegassem a esse ponto, mas não vou te pedir mais nada.
                - Melhor assim, Miriam. Só uma coisa, você se afastou de mim e eu respeitei o seu espaço, quis seguir no teu ritmo mesmo sem saber como as coisas funcionavam pra você, em nenhum momento eu deixei de te amar, nem mesmo agora.
                - Amar é quase como andar de bicicleta, se a gente parar cai. O amor não pode parar. Eu quis ir embora e você me deixou ir, não é culpa sua, mas agora eu simplesmente não posso mais voltar.
                - Seria bonito te ver voltar.
                - Eu sei.
Ele colocou o dinheiro da conta sobre a mesa, arrumou a gola do casaco e ficou de pé. Eu podia ver cada linha de expressão daquele rosto refletir um desânimo e uma tristeza que me fazia triste também.
                - Mas se o que você quer é voar, passarinhos foram feitos pro céu e não pra gaiolas. Você não nasceu pra morar no meu peito, eu insisti, desde o começo. Foi tão bonito ter você, e você sabe que está doendo agora, mais que todas as vezes que brigamos.
                Fiz que sim com a cabeça. Ele veio até mim e me deu um beijo na testa e antes de me dar as costas, disse:
                - Voe.
Eu vou voar, pensei. Tomei todo o café já um pouco frio. E percebi que apesar da fina camada de tristeza que se acumulava em algum lugar do meu peito havia o riso, estampado, decidido, destemido, riso solto... Era impossível que tudo aquilo não doesse, estava doendo, mas não pesava, não maltratava, não era ferida profunda, nem mágoa nem nada, era uma despedida, era a estação final daquela linha, mas tudo bem eu sabia que mais cedo ou mais tarde chegaria outro trem, encontraria novos caminhos. E percebi que sozinha eu estava e ficaria bem. 



17 comentários:

  1. Até que fim ela tomou coragem, fiquei triste por ele, mas o amor não deve prender né.
    beijos

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  2. O amor antes de tudo liberta!

    Beijos, Lola.
    Obrigada por acompanhar, viu?

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  3. Que triste... Mas devia acontecer. Quando não se há mais amor de um lado, deve-se libertar o outro.

    :(

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    1. Esse é o tipo de fim inevitável.

      Beijos, Alexandre.

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  4. ... percebi que sozinha eu estava e ficaria bem...
    Sozinha! Sem o tal de Vicent, ok? rsss
    É para voar e não para se engaiolar de novo.
    Beijo.

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    1. Eita Claudio, Matou a pau agora.
      Mas pode deixar, esse passarinho não entra mais
      em gaiola não, ou será que entra? rsrs

      Pegou a Miriam na mentira, olha só isso.

      Beijos, querido.

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  5. Chorei com ele ;/ rs Me lembrou um pouco da minha história essa sua postagem.

    Então, Miriam fez o que era o melhor, escolheu voar, escolheu sair de um relacionamento que já estava sufocando ela. Mesmo ele se machucando, dizendo que seguiu o ritmo dela, no final das contas ele vai entender, e vai seguir a vida... ou pelo menos tentar. E não, Miriam não pode se apegar a Vicent, ela tem que continuar com os joguinhos de sedução, que eu tava adorando por sinal, rs. Ela tem que voar agora, tem que seguir o conselho do rapaz. (;

    Amei, tô amando cada tua palavra tua Mayra. Parabéns, vc escreve muuuito. rs
    Bjão moça. ;*

    http://changesl.blogspot.com.br/ -

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    1. Despertar emoções, tarefa difícil.
      Não fico feliz pelas suas lágrimas, mas sim pelo fato de tê-la tocado de algum modo.

      Ela não pode, mas será que ela não já está envolvida demais nessa história, será que ela não está se iludindo? Será que ela á não escolheu se encerrar na gaiola das próprias paixões antes mesmo de abrir as asas? Saberemos em breve. rsrs

      Muito obrigada por acompanhar, pelo carinho imenso e pelas palavras lindas.
      Grande beijo, Sam.

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    2. E tocou mesmo. Já disse, e repito, tô amando cada palavra sua. rs

      É, agora você me deixou muito mais curiosa... Acho que ela já deve está envolvida mesmo, tanto é que creio que um dos motivos do termino foi esse também. Mas por outro lado talvez ela esteja se iludindo... aaah, poste logo o próximo episódio, please. rs

      Own, magina, é um prazer passar por aqui, me encanto a cada postagem.
      Beijão, moça. (:

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    3. São inúmeras possibilidades, hahaha

      "Quantos segredos traz o coração de uma mulher?"

      Mais uma vez: - Muitíssimo obrigada pelo carinho!

      Beijos

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  6. Lendo momentos como esse, penso nos dramas que costumam ser as lutas, dentro de nós, para realizarmos um amor livre, com desapego...

    Amor é sinônimo de liberdade responsável, algo vivido integralmente pelas mentes maduras, longe do medo da perda.

    A respeito disso, uma vez escrevi:

    Sem você aqui,
    Sempre o tudo
    É feito o nada...
    Mas estou aprendendo a aceitar
    Que a graça do verbo amar
    É estar em alguém,
    E não se apegar:
    Onda que vem e vai
    Sem querer,
    O meu querer
    Que agita feito brisa,
    Esse azul de nosso mar...


    Beijo no coração!

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    1. O amor é uma palavra supervalorizada e um sentimento de um milhão de revés, livre ou engaiolado, em um milhão de formas ainda assim em sua essência sempre o mesmo, amor.

      "Que a graça do verbo amar é estar em alguém"
      Lindo demais. *-*

      Beijão, moço.

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  7. É complexa a maneira que os relacionamentos funciona em suas atitudes e não-atitudes. Ninguém pode dizer que o certo funciona pra todos e que o errado amaldiçoa todo e qualquer sentimento que exista.
    Vejo que os finais existem pra todos mas poucos tem coragem de aceitar as falhas e abandonar a pessoa que ama - ou acha que ama. Ninguém considera a individualidade como um aprendizado para novos sentimentos e relações. As pessoas tentam perpetuar o insuportável no temor de uma solidão eterna, mas a solidão acompanhada é a pior de todas.

    Estamos sempre indo embora de alguma coisa. O segredo é encontrar alguém que também esteja se despedindo.



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    1. "Estamos sempre indo embora de alguma coisa. O segredo é encontrar alguém que também esteja se despedindo"

      Não tenho palavras pra responder a este comentário, maravilhoso.
      Muito obrigada, Bruno.

      Beijos, querido.

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  8. :(
    Fiquei sentida aqui. Eu esperava mesmo o fim do relacionamento dos dois, mas por que o fim tem sempre que vir carregado de algum tipo de tristeza?
    E o pior, de lembranças.

    Agora, ela tem mesmo que voar!
    Aproveitar dessa liberdade, e não condicioná-la a ninguém. Essa é a parte mais difícil.

    Jhosy

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  9. O fim mesmo quando é necessário vem com toda essa carga, mas serve como aprendizado de alguma forma.

    Vai voar direto pra arapuca. haha.

    Beijos. Jhosy

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Obrigada.