01 outubro 2014

Capítulo 46



                   Como poderia me negar a tudo que estava sentido? Como encontraria forças para dar as costas e ir embora para sempre? Eu sabia que em algum momento seria necessário esquecer de tudo aquilo, mas para esquecer, primeiro, eu precisaria lembrar. Lembrar até que todas as minhas forças se esgotassem. E um momento para ser lembrado é preciso ser vivido intensamente. 
             Sentia-me sem ar enquanto as mãos dele estavam sobre mim. Sentia-me queimar por dentro e algo doía profundamente. Sabia que as reações do meu corpo não se davam somente pelo que estava vivendo ali. Não só pelos beijos dele no meu pescoço, pelo contato da sua pele quente com a minha. Não, todo sentimento ia muito além do sexo e do próprio desejo que alimentávamos. Tinha certeza que, um dia, somente pelo fato de lembrar-me dele, tudo, voltaria a arder e a doer com a mesma intensidade.

            Estávamos completamente envolvidos de uma maneira que nenhum de nós foi capaz de prever. O que sentíamos era muito mais forte que nós mesmos. Nenhuma explicação seria capaz de nos convencer do contrário. Para ser sincera, houve um momento em que algo me surpreendeu, o momento em que: tudo que eu conseguia ver estampado no rosto dele era que, não havia mais ninguém ocupando seus pensamentos. Ele estava onde e com quem realmente queria estar. Não senti esperança, exatamente, mas deixei de me importar porque eu tinha essa pequena tábua de salvação e me agarraria a ela o máximo que me fosse permitido. Afinal, por que eu me importaria com o depois se era o agora que realmente importava, e se era eu quem o tinha nos braços? Naquele momento ele havia me escolhido e nada nem ninguém poderia negar. Já não mais importava se tudo não passava de um grande e desastroso erro.

                    – Eu nunca conseguiria dizer não a você. Vince...

Minha voz saiu num sussurro e as minhas palavras fizeram-no sorrir de uma forma que nunca havia visto antes. Afastou uma mecha de cabelo da minha testa já inundada de suor e beijou-me devagar e carinhosamente.

                   – Como alguém pode ser assim tão doce como você? Sinto que também não posso te dizer não, nunca seria capaz disso. – ao dizer isso, seus olhos dançavam sobre o meu rosto, e já não me pareciam tão impenetráveis.

Um pensamento amargo me ocorreu. Ele já havia dito não para mim no mesmo momento em que disse sim à outra. 

                   –  Por que tem que ser assim? – lamentei por estar diante de quem eu mais queria, e por saber que dentro de algumas horas teria que renunciar a tudo. 

A resposta não veio, também não esperava que ele soubesse. Preferia acreditar que de algum modo seria difícil para ele também, que ficariam marcas, que doeriam, ao menos um pouquinho. 

               – Eu quero você... Eu preciso de você... Por favor... Seja meu... – minha voz novamente saiu num sussurro, entrecortada por suspiros e pelos soluços que eu tentava conter. 

As lágrimas despencavam pelo meu rosto, mas eu não poderia deixar que minha dor fosse maior que o prazer que estava sentindo em tê-lo ali comigo, envolvendo meu corpo naquele abraço e me beijando a face com tamanha doçura. Eu precisava fazê-lo meu e precisava acreditar nisso mais que tudo. 

                  – É isso que você realmente quer?  sua voz estava mansa, mas séria. 
                  – É exatamente tudo que eu mais quero. – respondi sem pestanejar. 
                  – Você sabe, sou incapaz de dizer não para você. 

Eu quis acreditar que aquilo não acabaria nunca mais, que viveríamos aquele momento para sempre. Desejei com todas as minhas forças que a realidade não nos obrigasse a dizer não, mas no íntimo eu tinha plena consciência do quanto isso era impossível. Então simplesmente fechei os olhos e me deixei levar.    

                   – Vince. 
                   – O quê?
                   – Me leva pra sua cama, agora!   

Talvez, em algum lugar do futuro aquilo deixasse de significar tanto, mas ainda assim, sempre seria algo importante e inesquecível. 

              De repente estávamos novamente no quarto, nossas roupas espalhadas pelo chão. O suor grudando nossos corpos, o ar impregnado de desejo. Vince me beijava devagar, explorando minha boca, enquanto suas mãos repousavam em meus seios. Estava completamente entregue aos sentimentos e as sensações. Abri os olhos e pude ver seu rosto, as sobrancelhas tensas e os olhos semicerrados. Desejei-o dentro de mim ainda mais. Minhas mãos procuravam-no e eu pude ver o prazer refletido em seu rosto, deslizando através do seu corpo quando finalmente encontrei o que procurava. De alguma forma nos pertencíamos e havíamos de nos pertencer para sempre. O contrato estava quebrado, havia milhões de provas estampadas em nossos corpos ávidos por mais, mas sem pressa pro fim. Nunca mais seríamos os mesmos. E mesmo que ninguém soubesse, nós saberíamos. As provas estariam em nossas mentes o tempo inteiro, para sempre, mesmo quando fôssemos embora. 

              Queria cobrir seu corpo inteiro com todos os beijos que fosse possível. Queria que seu corpo inteiro ficasse extasiado sob a impressão dos meus lábios de um cor de rosa desbotado. Queria ser parte dele, pertencer a ele. Queria criar algo impossível de ser desfeito. Joguei meu corpo contra o seu, sobre o seu, o que acabou por lhe arrancar um riso frouxo e um gemido rouco. Ele parou, contemplou a imagem que pairava sobre ele. Parecia deliciar-se com o que via. Eu estava exposta, entregue, estava sobre ele e ainda assim isso demonstrava toda a minha fragilidade. Vince sabia que não pretendia dominá-lo porque já estava completamente dominada pelo seu olhar. Ele estendeu uma mão em direção aos meus cabelos que deslizavam desalinhados por sobre meus ombros. Meus braços firmes, apoiados na cama, sustentando meu peso. Minhas coxas envolvendo-o, minhas pernas uma de cada lado das suas próprias pernas. Meu sorriso carregado com o mais sincero deleite e êxtase. Meu rebolado lento, os movimentos quase involuntários do meu quadril. Meu corpo buscando desesperadamente por prazer. Podia senti-lo quente, podia prever o que cada movimento meu provocaria nele e me divertia com isso.

                 – Eu gosto de brincar com você... – sussurrei.
                 – Eu gosto que brinque comigo. – sua voz veio baixa e rouca. 

Ele fechou os olhos, sua face se iluminando de desejo e prazer, sua respiração entrecortada. Meu coração estava acelerado, sentia-me fora de controle. Eu lutava em busca de ar. Meu corpo estremecia a cada movimento dele. Queríamos ir além das provocações mais lentas. Senti quando suas mãos apertaram minha cintura e me guiaram a encontrar o melhor ritmo para nós dois. Éramos um só, nos movendo em sincronia. Nossos suspiros, gemidos e frases ousadas pairavam soltos pelo ar e ecoavam baixo em nossos ouvidos. Eu estava a ponto de gritar, mas sufoquei tal vontade num beijo quente e úmido. Senti novamente o encontro de nossas línguas e algo ferveu ainda mais dentro de mim. As palavras são absurdamente insuficientes para transcrever todo o prazer no qual estávamos submersos. De repente meus braços vacilaram, as forças me faltaram e fui de encontro aquele peito largo que me recebeu alegremente. Senti as descargas elétricas espalharam-se pelo corpo quando meus seios tocaram sua pele, suada e quente. Vinc então puxou-me para baixo e eu pude sentir seu peso sobre mim, seus movimentos se tornaram mais frenéticos e fortes. Ele tinha sede e me tomava inteira a goles cada vez maiores. 

                Tudo aquilo era irreversível, cada sensação ficaria para sempre registrada em meu corpo e em minha mente. Todo o prazer e delírio. Sentia-me fora de órbita, já não pensava em mais nada a não ser no que estava prestes a explodir em mim com toda força. Fomos cada vez mais rápido, respirando com dificuldade, absorvendo cada segundo que nos
 restava. De repente não havia mais nada, estávamos absolutamente conectados, concentrados no prazer que sentíamos e provocávamos. Parecia impossível que o mundo inteiro não fosse contagiado pelo que sentíamos. A Terra estava girando em câmera lenta e tudo que eu mais queria era que parasse para sempre naquele exato momento em que meu corpo se arqueava de prazer, naquele exato momento em que os lábios dele começaram a traçar uma rota de beijos da minha boca até o interior das minhas coxas. Era radioativo. Seus lábios queimavam minha pele, sua língua me provocava arrepios cada vez mais intensos. Ele deleitava-se com meu corpo, com a minha urgência e brincava com a minha sanidade. Ia e voltava, percorrendo minhas pernas e barriga e finalmente encontrou-me e surpreendeu-me com uma onda de prazer inesperada. Ele sorriu quando viu meu corpo se contorcer. Eu estava febril. completamente encharcada de suor e úmida de desejo. Enterrei minhas mãos em seus cabelos, eu estava desesperada para que aquela sensação nunca mais acabasse. Eu daria a eternidade se isso bastasse para que aquele momento nunca acabasse. Por favor, não pare agora, era tudo no que eu conseguia pensar e ele parecia ler meus pensamentos.

                Eu queria morrer e eternizar cada segundo, sem dar tempo para que nada do que viesse depois estragasse aquele prazer tão intenso. Senti um grito agudo formando-se em minha garganta, mas logo fui sufocada por um beijo quente, pela sensação daquela barba arranhando meu rosto. 

             Quis tomá-lo em meus lábios e isso pareceu levá-lo ao delírio. O prazer era tamanho que em certos momentos parecia que algo se romperia dentro de nós numa explosão incontrolável. Não havia vergonha, nem pudor. Éramos duas pessoas completamente entregues. Era minha vez de saciar aquela sede incontrolável, de sentir o sabor, de vê-lo entregue àquele simples capricho. 

                 Miriam... sua voz veio sufocada entre um gemido. 
                 Vinc...
              Eu não aguento mais esperar...  tinha os olhos fechados e de repente seus lábios se contraíram numa tentativa de reprimir um gemido mais alto, havia em seu semblante a urgência de um gozo iminente. 
                 Eu também não - respondi baixinho.

Sentei-me em seu colo e ao senti-lo novamente dentro de mim estremeci como se fosse a primeira vez. Estava inebriada de prazer. Sentia meu corpo movendo-se involuntariamente em espasmos cada vez mais intensos. Vincent sufocava meus gemidos com beijos cada vez mais desesperados. Nossas bocas se desencontravam com a agitação dos nossos movimentos, mas ainda assim se procuravam ininterruptamente. Minhas unhas arranhavam suas costas. Lágrimas brotaram dos meus olhos. Era tudo tão intenso que de súbito tornei-me incapaz de dizer onde estava. Talvez, muito provavelmente, no céu!

             Senti seu corpo se agitar, ouvi-o dizer algo que não fui capaz de entender, pois já não conseguia ouvir mais nada a não ser o sangue pulsando ferozmente em minhas veias e ressoando em meus ouvidos.

                – Vinc... eu vou...  minha voz vacilou e emudeceu.

E antes que eu pudesse terminar o que queria dizer senti-me invadida por uma sensação avassaladora que se sobrepôs a todos os meus sentidos. Meus olhos se fecharam com força, um grito rouco escapou por entre meus lábios e meu corpo inteiro se contraiu e se arqueou incontáveis vezes. Vinc segurou-me com força enquanto eu transbordava de prazer; enquanto o gozo tomava conta de mim por completo. Ele me segurou até que eu me desmanchasse num sorriso lívido e meu corpo se pusesse a tremer levemente, exausto, mas completamente satisfeito. Então eu me vi em seus olhos e mergulhei naquela expressão tão forte. Por alguns segundos poderia jurar que ele também tinha os olhos marejados. Ainda estava em mim, envolvi-o com meus braços e o apertei contra o peito. Era sua vez de mergulhar naquela imensidão incontrolável e avassaladora de prazer. Eu senti explodindo em mim e isso fez com que meu corpo estremecesse novamente, e novamente fui invadida por aquela sensação de descontrole e leveza, de entrega e de prazer absoluto. Como aquilo poderia estar acontecendo? Exaustos nós nos olhamos e sorrimos como dois adolescentes, ainda sem entender ao certo o que havia acontecido. Ele secou uma lágrima do meu rosto e me beijou a boca devagar e com ternura. 

               – Você é absurdamente linda. Isso que você faz comigo é inexplicável. 

De repente eu senti meu coração se partir. Eu estava presa naquele olhar, presa entre aqueles dedos percorrendo minhas costas, suavemente. Havia algo entalado em minha garganta, algo que eu não poderia dizer sem correr o risco de me magoar ainda mais profundamente. 

              Eu nunca havia sido tão feliz e infeliz de uma única vez. O que restaria de mim? Ele não poderia ser o homem da minha vida, por mais que eu quisesse acreditar nessa possibilidade, pois ele já exercia esse cargo na vida de outra pessoa. Vincent me aninhou em seus braços e de olhos fechados afagou meus cabelos úmidos. Eu vi a claridade se infiltrar por trás das cortinas e desviei minha atenção, não queria pensar que nosso tempo estava acabando. Ele continuava com os olhos fechados, uma expressão tranquila no rosto. Eu movimentei meus lábios e disse em silêncio aquelas três palavras que representavam todo o sentimento que me despedaçaria dentro de muito pouco tempo, na esperança de que ele pudesse sentir ao menos um pouco de tudo aquilo.

               –  Vinc. 
               –  Oi. 
             –  Já é de manhã. Não acha melhor eu ir embora? Não quero... –  as palavras saiam com dificuldade, eu tinha medo da resposta. –  criar problemas.
               –  Não, eu preciso que você fique. Ainda é domingo. Ainda temos tempo. 

Eu respirei aliviada, realmente não esperava ouvi-lo dizer que queria que eu ficasse, muito menos que precisava de mim.

               – Vinc?
               – Oi. 
               – Eu... ah, foi incrível.

Ele abriu os olhos e me fitou. Não faço ideia se conseguiu ver como minhas bochechas estavam vermelhas.     

                  – Eu nunca vou esquecer. Foi incrível pra mim também. Não só o que fizemos, mas o que sentimos. Todas as coisas que você me disse...

Ele ficou em silêncio. Fiquei imaginando se talvez houvesse a possibilidade dele estar se sentindo exatamente como eu estava, feliz e infeliz, tentando encontrar alternativas para não ter que dizer adeus. Fiquei imaginando se por acaso ele também estava com aquelas palavras entaladas na garganta, encontrando um jeito menos difícil de sentir tanta coisa. Mas não tinha como saber, e eu nunca perguntaria. Vinc era comedido demais, cauteloso, ele se saíra muito melhor que eu e não podia culpá-lo por ter se imunizado de algum modo.   

            – Obrigada. Eu realmente não sei o que dizer. Confesso que estou confusa, mas não importa. Foi incrível. Eu nunca vou esquecer você, nunca vou esquecer cada segundo do que temos vivido.
              – Não pense no tempo, não se sinta assim. Isso não precisa ser um adeus, você sabe...         

            Ele me puxou contra o peito, me envolveu em seus braços e eu o beijei, deixando minha mente limpa. Algumas pessoas dizem que só é feliz aquele que consegue esquecer. Eu realmente não tinha certeza se conseguiria ser feliz. 

          – Boa noite. Você é fantástica, garota. 
         – Boa noite. Eu vou fingir que acredito em você. Talvez consiga um pouco mais de autoconfiança.  

Ele esboçou um sorriso e voltou a fechar os olhos, sem me soltar dos seus braços. Eu relaxei, sentindo seu cheiro, ouvindo as batidas do seu coração e evitando pensar no que faria com a minha vida depois. Estava completamente perdida.

CONTINUA...